“A jurisprudência já reconhece a responsabilidade civil de pais e síndicos por acidentes em áreas comuns, com base no dever de vigilância e no risco previsível”
A Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 4309/2020, que prevê multa de cinco a 20 salários-mínimos para quem deixar crianças menores de 12 anos desacompanhadas em veículos, coberturas ou espaços de uso comum em condomínios, como piscinas, elevadores e áreas de lazer. A proposta, de autoria da ex-deputada Flordelis, tramita apensada ao PL 237/21 e será incorporada ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Além dos responsáveis legais, síndicos e administradores também poderão ser multados entre três e dez salários de referência, caso não afixem, de forma visível, as regras de acesso e uso dos espaços comuns, conforme determina o substitutivo aprovado pela relatora, deputada Laura Carneiro (PSD-RJ).
Para o advogado Kevin de Sousa, especialista em Direito de Família e Sucessões e sócio do escritório Sousa & Rosa Advogados, o projeto se articula de forma coerente com os princípios do ECA, especialmente os de proteção integral (art. 1º) e prioridade absoluta (art. 4º). “O acréscimo dos artigos 85-A, 85-B, 258-D e 258-E ao ECA amplia o dever legal de cuidado, estendendo-o ao contexto condominial — um espaço privado de uso coletivo”, afirma.
Embora não haja precedentes diretos de multas aplicáveis por lei federal nesse contexto, o advogado destaca que a jurisprudência já reconhece a responsabilidade civil de pais e síndicos por acidentes em áreas comuns, com base no dever de vigilância e no risco previsível. “A proposta não é uma ruptura, mas sim um reforço normativo a uma tendência de responsabilização já perceptível no Judiciário”, completa.
Síndicos terão novas obrigações legais
O projeto impõe deveres administrativos claros aos síndicos, como a obrigação de afixar avisos visíveis sobre as regras de acesso de crianças às áreas comuns. A omissão poderá gerar sanções civis e administrativas, ampliando o escopo de atuação dos gestores condominiais.
Sousa alerta que a fiscalização do cumprimento pelas famílias será um desafio, e que os síndicos devem atuar como orientadores e notificadores, com apoio das assembleias para implementar sanções internas.
Apesar da previsão de penalidades, o texto não especifica qual autoridade será responsável pela fiscalização e aplicação das sanções. Segundo o especialista, será necessária regulamentação posterior — por decreto ou portaria — para definir o órgão competente (como Conselho Tutelar ou Ministério Público), o rito administrativo e os meios de prova, como imagens de câmeras ou relatos de funcionários. “Enquanto essa regulamentação não for feita, a aplicabilidade prática da multa ficará comprometida, o que exige atenção legislativa para evitar uma norma de eficácia simbólica”, conclui.
Fonte: Kevin de Sousa: advogado civilista, mestre em Direitos da Personalidade, especialista em Direito de Família e Sucessões e sócio do escritório Sousa & Rosa Advogados.