Barraca Biruta faz manifestação com artistas e frequentadores para manter o patrimônio cultural de Fortaleza
Um dos únicos espaços para shows nacionais e de artistas cearenses nos anos 90, a Biruta não pode ser demolida após a sanção da Lei 15.092, de 2025, que declarou as barracas da Praia do Futuro como patrimônio cultural brasileiro*_
Há 35 anos, um ponto na orla leste de Fortaleza se tornava referência de inovação, liberdade criativa e encontro de gerações: a Barraca Biruta. Fundada em 31 de dezembro de 1990 por Fernando Vilela Sales, colecionador, DJ, produtor e agitador cultural, com seu sócio Rubens Barrocas, a Biruta transcendeu o conceito de barraca de praia para se tornar um verdadeiro centro de efervescência artística e musical do Ceará nos anos 90. Hoje, após cinco anos de portas fechadas, o espaço luta para não desaparecer de vez da paisagem afetiva e cultural de Fortaleza.
Com um histórico de festas temáticas autorais, apresentações de artistas locais, nacionais e internacionais, quando na cidade de Fortaleza não existia Carnaval, Pré Carnaval nem apresentações em datas comemorativas, era na Biruta que a população podia assistir mestres da música do Brasil, e onde os artistas cearenses se apresentavam.
O fechamento repentino em março de 2020, com o decreto da pandemia da Covid-19, foi um golpe duro para o espaço, que já operava exclusivamente como casa de eventos.
A tentativa de arrendamento do espaço, em 2023, acabou frustrada com o rompimento unilateral do contrato por parte do arrendatário, sem que houvesse quitação de débitos ou qualquer reforma iniciada. Em abril o proprietário Fernando Vilela recebeu um prazo absurdo de 30 dias para solucionar alguns problemas apontados Secretaria do Patrimônio da União (SPU) – caso não conseguisse solucionar algumas dívidas de taxas e alguns ajustes estruturais a barraca seria demolida nesse curto espaço de tempo. Fernando já solucionou todos as pendências, com a ajuda de advogados e da sociedade civil.
Com a sanção da Lei 15.092, de 2025, que declarou as barracas da Praia do Futuro patrimônio cultural brasileiro, cresceu a mobilização por soluções definitivas para a reabertura da Biruta. Vale lembrar que, no que diz respeito ao critério “eventos culturais”, nenhuma outra barraca contribuiu tanto quanto a Biruta para a cidade de Fortaleza, com sua intensa e diversa programação.
Ausência de centros culturais na região e potencial de transformação
A Praia do Futuro, apesar de ser um dos principais cartões-postais de Fortaleza, não conta atualmente com nenhum centro cultural público ou privado voltado à comunidade local. A ausência de espaços formais de cultura e arte afeta principalmente os jovens das comunidades carentes no entorno, que carecem de oportunidades de acesso à formação artística e profissional.
Nesse contexto, Fernando Vilela propõe uma associação com o poder público para que a Biruta se transforme em um centro cultural de fato — não apenas um espaço de festas, mas de promoção de arte, oficinas, cursos profissionalizantes e iniciativas culturais voltadas à juventude. “A Biruta pode ser vetor de descentralização cultural no Ceará, alinhada às diretrizes do Estado e da cidade. Podemos ser um polo de arte, cultura e formação profissional na Praia do Futuro”, defende.
Um abaixo-assinado com dezenas de assinaturas de artistas cearenses vem ganhando força nas redes sociais. Para fortalecer a mobilização, Fernando e apoiadores preparam uma grande ação cultural no local, neste domingo às 16h20, nesse evento que pretende atrair visibilidade e chamar atenção para a necessidade de salvar esse patrimônio afetivo e artístico de Fortaleza.
Operação Praia Limpa e desafios estruturais
Em abril a Praia do Futuro foi palco da Operação Praia Limpa, coordenada pela Secretaria do Patrimônio da União (SPU) em parceria com a Prefeitura de Fortaleza. Durante a primeira fase da operação, foram retirados equipamentos de 23 estabelecimentos que estavam em local inadequado, atrapalhando o fluxo de pedestres e viaturas que precisam circular pela praia. A ação atendeu a recomendação do Ministério Público Federal, que recomenda a remoção de obstáculos na faixa de praia e a demolição de construções sem autorização da União.
Para os comerciantes que tiveram suas barracas destruídas, a falta de uma notificação prévia sobre a operação dificultou a remoção dos materiais e, segundo eles, alguns itens chegaram a ser levados pela Prefeitura. A massoterapeuta Manuella Oliveira, que perdeu sua única fonte de renda com a demolição de sua barraca, lamentou a falta de aviso prévio e a perda de seu meio de sustento.
Resistência e futuro
A história da Biruta é também a história da Fortaleza cultural, livre e criativa. A sua reabertura — agora, com nova função social — pode simbolizar o reencontro de gerações e a construção de um futuro mais inclusivo para a Praia do Futuro, transformando um espaço emblemático de lazer em instrumento de cidadania, arte e transformação social.