O Dia Mundial da Saúde Mental, celebrado em 10 de outubro, é um momento extremamente oportuno para refletirmos sobre um tema que perpassa e afeta a humanidade de maneira profunda e ampla. No entanto, é fundamental reconhecer que um dia no ano não é suficiente para abordar as questões complexas que envolvem a Saúde Mental no Brasil e no mundo.
A Crise da Saúde Mental no Brasil
A Organização Mundial da Saúde (OMS) tem alertado para a crise de Saúde Mental que afeta o Brasil. De acordo com dados da instituição mais importante do mundo quando o assunto é “saúde”, o Brasil possui a população mais ansiosa do planeta, além de ser a mais deprimida da América Latina (e, em relação a todos os países americanos, ficamos em 2º lugar no ranking da depressão). O aumento das taxas de suicídio, que dobraram nas últimas duas décadas, com uma média de 45 suicídios notificados por dia, é uma prova alarmante dessa crise. Uma crise que se intensifica em todas as faixas etárias, em todas as etnias e em todas as classes sociais da nossa população.
Fatores Sociais e Econômicos Contribuem para a Crise
De maneira que pode ser facilmente verificada e atestada, o Brasil e o mundo enfrentam uma série de desafios sociais e econômicos que têm impacto direto e inegável na Saúde Mental das populações. Questões como violências urbanas, injustiças sociais, racismo, machismo, xenofobia, crises migratórias, feminicídios, lgtbfobias, precarização das condições de trabalho, desemprego, trabalho infantil, trabalho análogo à escravidão, abandono de idosos, ideologias de vida intoxicadas pelo hipercapitalismo, guerras, degradação ambiental e endividamento financeiro das famílias são alguns fatores que contribuem para a diminuição do bem-estar emocional das pessoas, o favorecimento de transtornos mentais e a eclosão de problemas psicossociais.
A Limitação do Dia Mundial da Saúde Mental
É inegável que o Dia Mundial da Saúde Mental é um importante ponto de partida para conscientização da humanidade, mas não pode ser o único. A complexidade dos desafios que enfrentamos exige um compromisso sistemático, impactante e contínuo. É por isso que o Brasil deu um passo importante ao instituir o Janeiro Branco como o mês oficial de conscientização sobre a Saúde Mental. Essa campanha, que nasceu da sociedade civil brasileira em 2014, se tornou Lei Federal em abril de 2023, tornando o Brasil um país pioneiro no mundo nesse esforço individual e coletivo, público e privado, político e pedagógico em prol de vidas mais saudáveis e em paz.
O Janeiro Branco: Um Compromisso Contínuo com a Saúde Mental
Neste valiosíssimo, porém, rápido 10 de outubro, importa dizer que, há uma década, o Janeiro Branco mobiliza cidadãos, profissionais da saúde e autoridades públicas em torno das questões da Saúde Mental. Esta campanha, que ocorre em todo o país e já ganhou o mundo, vai além de um único dia e proporciona um mês inteiro de intensa conscientização e vastíssima pluralidade de ações. E mais: quando janeiro termina, a associação civil sem fins lucrativos que a coordena, o Instituto Janeiro Branco, segue, de janeiro a janeiro e de forma inédita no Brasil e no mundo, trabalhando por uma cultura da Saúde Mental nas relações humanas e sociais. É uma oportunidade não apenas para educar as pessoas sobre como promover Saúde Mental em suas vidas, mas também para inspirar a criação de políticas públicas voltadas para a Saúde Mental de toda a população. Nesse sentido, a Rede de Atenção Psicossocial brasileira (RAPS), a Luta Antimanicomial e o ‘cuidado em liberdade’ no Sistema Único de Saúde (SUS) clamam por compreensão, apoio, investimentos e respeito.
A Construção de uma Cultura da Saúde Mental
A Saúde Mental não pode ser tratada como uma preocupação isolada. Ela é um eixo estruturante da saúde global dos indivíduos e da sociedade. Isso implica em reconhecermos o caráter multidimensional, multifatorial e plurideterminado de tudo o que diz respeito à Saúde Mental humana: ela tem a ver com questões biológicas, sociais, econômicas, políticas, culturais, espirituais, tecnológicas e uma série de outras condições sempre em movimento e em construção. Por isso, é essencial que construamos uma “cultura da Saúde Mental” em todo o mundo e em todas as relações sociais existentes no mundo, onde as pessoas, por um lado, entendam a importância de qualificar as condições objetivas e subjetivas nas quais todos vivem e, por outro lado, entendam a importância de cuidar da própria Saúde Mental, da Saúde Mental das pessoas com as quais convivem e das pessoas com as quais dividem os espaços públicos e sociais.
O lançamento do livro “Saúde Mental Enquanto Há Tempo!” (Ed. Uiclap), do psicólogo Leonardo Abrahão, e a próxima edição da Campanha Janeiro Branco, em janeiro de 2024, são oportunidades para aprofundar o debate sobre a Saúde Mental e inspirar ações concretas. Devemos lembrar que a Saúde Mental é um direito fundamental de todos, e é nosso dever como sociedade e indivíduos promovê-la, defendê-la e ampliá-la.
Em um mundo onde as pressões e desafios estão em constante crescimento, investir na Saúde Mental é um imperativo moral, ético e social. Devemos agir agora, enquanto há tempo, para criar um mundo onde a Saúde Mental seja prioridade, compreendida, fortalecida e cuidada por todos.
Leonardo Abrahão
Psicólogo, Presidente do Instituto Janeiro Branco – Associação Sem Fins Lucrativos; dedicada à criação da cultura de Saúde Mental na Humanidade, Palestrante, Professor, Autor dos livros – “Promoção da Vida: Cuidando dos Indivíduos e Mudando as Sociedades, Todos os Suicídios São Evitáveis” e “Saúde Mental Enquanto Há Tempo!”, e idealizador da Campanha Janeiro Branco, sancionada como Lei Federal em abril de 2023, por meio da Lei 14.556/23.