Gravado em Vargem Grande do Sul, Vila Polar transforma a destruição do patrimônio em arte política e afetiva — um curta que grita contra o silêncio das demolições e pergunta: o que ainda somos quando apagam nossa história?
Casarões tombam. Armazéns viram escombros. Nomes de ruas mudam, placas somem, muros desbotam. E junto com tudo isso, desaparecem também memórias, afetos, histórias de famílias inteiras. Em silêncio. Sem alarde. É contra esse processo de apagamento cotidiano que o curta-metragem Vila Polar, dirigido por Paulo Tothy, ergue sua voz — ou melhor, suas imagens, suas ruínas, suas palavras projetadas em fachadas decrépitas.
O filme será lançado no dia 25 de julho, em Vargem Grande do Sul (SP), com entrada gratuita no Espaço Mais Cultura. Mas Vila Polar não é só um lançamento local: é uma obra que reverbera nacionalmente porque aponta para um problema estrutural do Brasil — a incapacidade de preservar a própria história.
Na narrativa ficcional, um carteiro percorre o bairro onde vive há anos e começa a notar estranhos sinais: aparições, mensagens, ruídos do passado. A Vila onde mora já não é a mesma. O futuro parece engolir o ontem com pressa. Mas a ficção, aqui, é apenas uma lente para olhar o real: casarões históricos de Vargem vêm sendo demolidos, dando lugar ao vazio — físico e simbólico.
“Este filme partiu da casa da minha avó”, conta o diretor. “Ela é uma personagem central da história. Ao ver a cidade perdendo parte de suas marcas, percebi que também estava perdendo algo em mim. O filme é um jeito de resistir, de transformar ruínas em linguagem.”
E é disso que se trata Vila Polar: transformar a destruição em narrativa, a ausência em presença. Com a colaboração do artista Cauê Maia, o filme projeta poemas e imagens sobre paredes prestes a desaparecer — numa espécie de despedida, mas também de denúncia. Como diz o próprio artista: “É uma memória acesa por poucos minutos, mas que permanece no imaginário de quem vê. A cidade também é feita de vestígios.”
A direção de arte é assinada por Elisa Sbardelini, arquiteta da cidade, que aponta o contraste com municípios vizinhos: “Enquanto outros lugares investem em preservar, aqui seguimos apagando. A cada prédio derrubado, uma camada da nossa identidade é arrancada.”
Viabilizado com recursos da Lei Paulo Gustavo, o curta é também exemplo da potência das políticas públicas de cultura em regiões fora dos grandes centros. “A Lei permitiu que histórias locais fossem contadas com dignidade técnica e poética. Isso muda tudo. É uma revolução silenciosa acontecendo por meio da arte”, diz Paulo, que também atua como curador de cineclubes e projetos audiovisuais no Sul de Minas e interior paulista.
A noite de estreia terá ainda a exibição de Recife Frio (Kleber Mendonça Filho) e Retrato de Dora (Bruna Callegari), num programa que costura ficção, documentário e memória. Após os filmes, haverá conversa com realizadores, elenco e equipe.
Mais do que um filme sobre um bairro, Vila Polar é uma carta aberta às cidades que estão se esquecendo de si. E talvez, no país onde tudo parece começar do zero todos os dias, este seja o lembrete mais urgente: ruínas não são só restos. São pistas. São o que sobra quando tudo o mais é apagado.
SERVIÇO
🎬 Lançamento do curta-metragem “Vila Polar”
📅 25 de julho de 2025
🕢 19h30
📍 Espaço Mais Cultura — R. João Malaguti, 385, Jardim Novo Mundo — Vargem Grande do Sul (SP)
🎟️ Entrada gratuita