No final de 2022, a bancária Sueli (nome fictício para preservar a identidade da vítima), de 40 anos, pensou em tirar a própria vida. Forte, independente e com a vida financeira estabilizada, perdeu a casa onde morava e todas as economias ao se relacionar com Caio Henrique da Silva Camossato, de 37 anos, durante pouco mais de seis meses. “Perdi a casa em que morava, perdi as economias que demorei 10 anos para juntar, nem o nome limpo eu tenho mais. Cheguei a pensar em me matar. Não conseguia entender como eu tinha caído nesse golpe e no começo cheguei a questionar se tinha culpa”, comenta.
A enfermeira Alice (nome fictício para preservar a identidade da vítima), de 39 anos, perdeu R$ 216 mil durante o ano em que se relacionou com Caio. A relação, que começou com passeios e presentes, terminou com uma medida protetiva em julho de 2022. “Ele me ameaçava e dizia que se eu não ficasse com ele, não ficaria com mais ninguém. Uma vez, em uma ligação, disse que encheria minha cara de bala”, conta.
Com a advogada Talita Silva, 33 anos, o desfecho da história foi diferente. Ela percebeu que estava sendo vítima de um golpe com dois meses de relacionamento. “Eu investiguei a vida dele e descobri que ele tinha feito outras vítimas. Conversei com uma delas, outra advogada, que também estava tentando reaver o dinheiro que ele pegou emprestado. Ele só devolveu o nosso dinheiro porque teve medo de responder na Justiça”, comenta Talita.
Talita, Sueli e Alice são três das, pelo menos, nove vítimas de estelionato sentimental de Caio. O homem, que se apresentava como produtor de uma grande gravadora, agia no eixo Rio-São Paulo. A dinâmica dos golpes que aplicava era a mesma. Ele conhecia as mulheres em aplicativos de relacionamento e logo após o primeiro encontro apresentava a família e os filhos. Demonstrava ter uma vida financeira bem-sucedida: fazia passeios de helicóptero, dirigia um carro caro, e dizia ter fazendas em Goiás.
Método
A advogada criminalista Jacqueline Valles, do escritório Valles e Valles Sociedade de Advogados, é especialista em assessorar vítimas deste tipo de crime e explica que o estelionato sentimental tem uma dinâmica comum à maioria dos casos. “O golpista aparenta ser uma pessoa financeiramente estável, se mostra o namorado perfeito e o relacionamento caminha em um ritmo mais rápido que o normal. Ele conquista a confiança das mulheres rapidamente. As histórias que contam para pedir dinheiro emprestado são parecidas: um negócio que está prestes a ser concretizado; um erro da operadora que bloqueou o seu cartão de crédito; questões familiares; golpes de supostos sócios e até ameaças de morte. É sempre uma história muito bem engendrada, o golpista age com métodos”, comenta a advogada.
Caio prometia a todas que pagaria os empréstimos. “Quando percebi, já estava pagando o mínimo da fatura do cartão de crédito. Rapidamente perdi minhas economias e a casa. Quando eu não tinha de onde tirar, ele me convenceu a fazer um empréstimo”, lembra Sueli.
Ameaça e agressão
Quando as mulheres passavam a cobrar os valores, namorado atencioso e dedicado saía de cena e Caio ficava violento, agressivo e abusador. “Toda vez que cobrava, ele fazia uma chantagem emocional, colocando em dúvida o amor e a confiança que sentia por ele. Quando passei a ser mais incisiva, ele passou para as agressões verbais e depois passou a me agredir durante o sexo”, comenta Sueli.
Investigações
A Delegacia de Defesa da Mulher de São Paulo instaurou inquérito para investigar o crime de estelionato e lesão corporal no caso de Sueli. O músico foi chamado para depor, mas não apareceu. “O estelionato sentimental ainda não está tipificado no Código Penal, mas já há um projeto neste sentido. A Justiça vem enquadrando esse crime, que tem se tornado cada vez mais comum, como estelionato, mas geralmente há outros crimes concorrentes, como lesão corporal, violência psicológica, ameaça e furto”, explica Jacqueline Valles.
A advogada criminalista conta que esses criminosos têm método para conquistar a confiança das vítimas e agem de uma forma que as levam acreditar nas histórias que eles contam. “Ele é um predador, ele é o criminoso e age de forma extremamente meticulosa para enganar as vítimas”, pondera Jacqueline.
Com Talita e Alice, a agressividade de Caio se manifestou em forma de ameaças de morte. Alice conseguiu uma medida protetiva contra o produtor e o inquérito que investiga o caso de Paula aguarda manifestação do Ministério Público.
O caso ganhou repercussão nacional quando a história das vítimas foi contada em reportagem no programa Fantástico deste domingo. Sueli, Mirela e Alice afirmam que decidiram denunciar Caio não só para tentar reaver os valores que perderam. “Nós queremos Justiça. Queremos que ele pague pelos crimes que cometeu e que não tenha a chance de fazer novas vítimas”, dizem.