Para Marcela Schmidt, a arte não é uma escolha tardia nem um caminho construído racionalmente ao longo do tempo. É essência. “Todo artista já nasce artista”, afirma. Natural de Lages, em Santa Catarina, e atualmente radicada em Blumenau, a artista visual construiu uma trajetória marcada pela sensibilidade, pela força simbólica das imagens e por obras que transitam entre telas intimistas e murais monumentais, sempre carregadas de emoção e significado.
Desde a infância, o desenho foi sua forma mais natural de expressão. “Como todos os artistas, eu ‘nasci desenhando’. Era minha brincadeira de criança favorita”, relembra. Ainda muito jovem, buscou cursos de arte e pintura disponíveis em seu entorno, mas foi em 1991, aos 10 anos de idade, que viveu um momento decisivo: sua primeira aula de pintura a óleo com o professor Elio Hahnemann, renomado pintor impressionista de Blumenau. Naquele encontro nasceu sua primeira tela — e um vínculo definitivo com a arte.
Embora tenha se formado em Arquitetura e chegado a abrir o próprio escritório, Marcela nunca se afastou completamente do universo artístico. Entre os caminhos profissionais, sentiu a necessidade de se reconectar consigo mesma. Foi no desenho que encontrou esse reencontro. “Fui em busca de algo que me colocasse mais em contato com as cores e os trabalhos feitos à mão”, conta. Essa inquietação a conduziu ao mestrado em Design de Produto, etapa fundamental para a redescoberta de sua identidade artística.

O início oficial da carreira nas artes plásticas aconteceu em 2014, impulsionado pela crescente valorização do trabalho manual e autoral. Naquele período, empresas do setor de confecção passaram a investir em estampas assinadas por artistas, e Marcela começou a comercializar criações em nanquim e aquarela para marcas do segmento. Uma águia desenhada em nanquim, em preto e branco, com traços minuciosos, foi a obra que abriu as portas para essa nova fase profissional.
Entre seus trabalhos mais marcantes está o retrato da cachorrinha Cristal, da apresentadora Ana Maria Braga, feito em lápis de cor sobre papel. A obra ganhou repercussão nacional quando foi exibida no programa da apresentadora, que se emocionou ao falar do trabalho. Outro destaque é o maior projeto já realizado pela artista: um mural com mais de 300 metros quadrados em uma indústria de produtos hospitalares de Blumenau, onde cores suaves e formas orgânicas transformaram completamente o espaço.
A lista de obras emblemáticas inclui ainda duas telas criadas para as entradas dos banheiros do Brava Mall, na Praia Brava de Itajaí — trabalhos que inspiraram uma série de retratos produzidos até hoje — e a pintura de um ovo de Páscoa gigante para a Osterfest 2024, em Pomerode, projeto que integra o livro Guinness.
Um verdadeiro divisor de águas na carreira de Marcela foi a tela “Garça Elton John”, que deu origem à coleção “A Dança das Garças”. A partir dela, surgiram mais 14 telas e uma identidade artística definitivamente consolidada. “As garças vêm ganhando cada dia mais importância na minha carreira. É como se elas estivessem se difundindo em mim”, reflete.
A coleção conquistou projeção internacional, com duas obras expostas em Miami, nos Estados Unidos, além de cinco exposições em São Paulo e duas na Alemanha — uma no Hunsrück-Museum, em Simmern, e outra no Castelo Rheinfels, em Sankt Goar. Repleta de cor, luz e movimento, a série personifica lendas mundiais da música em forma de garças. Cada tela é uma homenagem e um diálogo entre arte visual e memória afetiva. “As garças me representam”, resume a artista.
Em 2024, Marcela realizou também sua maior tela até então: “Traga luz para a vida dos outros”, com dimensões de 214 x 150 cm. Réplicas da obra, em fine art, foram vendidas com renda integralmente revertida para auxiliar na reconstrução da cidade de Cruzeiro do Sul (RS), atingida por enchentes. “Foi um chamado. Senti que podia, por meio do meu trabalho, fazer a minha parte”, afirma.
Após transitar por diversas estéticas, a artista vive atualmente uma fase mais contemporânea, com forte viés expressionista e diálogos sutis com movimentos clássicos, como o realismo. “Dificilmente criamos algo totalmente novo. O que fazemos é compilar, transformar e reinventar”, reflete. Para ela, este é um momento de maturidade, liberdade criativa e leveza.
A artista falar que os primeiros seis meses foram bem turbulentos, resume Marcela. Nesse período, realizou cinco exposições em cinco cidades diferentes — Florianópolis, Itajaí, Curitiba, São Paulo e Blumenau — com a série “A Luz da Pandemia”. O projeto reuniu 15 telas que retratam histórias reais de superação durante e após a Covid-19. Cada obra corresponde a uma história, reunida também em catálogos acompanhados por poemas escritos pela própria artista. O projeto pode ser conhecido em detalhes no site oficial: www.aluzdapandemia.com.
No segundo semestre de 2025, o ritmo foi mais tranquilo e direcionado à produção de acervo e encomendas, majoritariamente com o tema das garças. “Percebi que as encomendas agora são apenas de quadros com garças. As pessoas já reconhecem a garça como minha identidade artística”, afirma.
Uma virada de chave que confirma: quando a essência encontra sua forma, a arte cria asas e voa. Para 2026, Marcela Schmidt projeta a ampliação das encomendas, especialmente de garças personificadas, e o lançamento do livro Minha Filha em Outra Vida, ampliando sua atuação artística também no campo literário.