Quais critérios devem ser usados para que determinado jogador vista a camisa 10 de uma equipe? A pergunta se faz necessária, principalmente porque a mística, aqui no futebol brasileiro, começou meio que por acaso. Até a Copa de 1958, quem a vestia jogava no meio de campo, mais pelo lado esquerdo. O cabeça-de-área ficava com a camisa 5; na meia-direita jogava o 8; e a camisa 10 era do meia-esquerda. Mas os deuses do futebol resolveram interferir na história e, até hoje, por motivos não confirmados, Pelé, o garoto convocado para a Copa de 58, ficou com a 10. E a partir dali a gente já conhece a história.
- Continua após a publicidade -
A camisa 10 virou a do craque do time. Mas é bem verdade que outros craques usaram outros números, em especial no exterior, onde vemos outras numerações com a mesma idolatria. Mas vamos ficar aqui no Brasil. Principalmente porque, no último fim de semana, o Flamengo, clube mais popular do país, indicou que, em 2023, o atacante Gabriel Barbosa, o Gabigol, ou Gabi, vai usar a camisa que um dia foi imortalizada por Zico.
Domingo passado (13), no programa No Mundo da Bola da TV Brasil, questionei a escolha. Não pela qualidade do jogador, que marcou gols decisivos nas duas Copas Libertadores (2019 e 2022) que o Flamengo conquistou. Mas sim pelo comportamento, e me baseei na imagem do evento comemorativo feito pelo clube, em que Gabigol já subiu no trio elétrico sem camisa, ao contrário de todos os demais jogadores.
A discussão esquentou nos dias seguintes na redação, com telespectadores e com amigos. Opiniões favoráveis e contrárias. Resolvi estender para cá. E vou recorrer ao histórico do clube.
Pelos motivos originais, Evaristo de Macêdo e Dida vestiram a camisa 10 do Flamengo. Zico, que jogava na mesma posição, foi um herdeiro natural, mas também fez e muito por merecer a camisa, que transformou num ícone, como Pelé no Santos e na seleção brasileira. Depois dele, vários foram “escalados” para a função, incluindo Sávio, Petkovic, Renato Augusto, Adriano Imperador, Ronaldinho Gaúcho e, mais recentemente, Diego Ribas.
- Continua após a publicidade -
Como se vê, perfis distintos e, se eu tivesse de colocar em ordem os que mais bem souberam usar a 10 colocaria Petkovic, Adriano e Diego. Esse último, principalmente, por ter abraçado a causa rubro-negra em 2016, e ser um dos líderes no projeto que hoje está solidificado.
A história dos outros dois se mistura. Pet era o 10 em 2001, naquele famoso gol de falta em cima do Vasco. E também era em 2009, quando Adriano foi contratado. O Imperador queria a 10, mas numa votação pela internet a torcida deu a ele a camisa 9. Só que, por opção mercadológica, o voto do torcedor prevaleceu por poucos jogos. Adriano vestiu a 10, e a Petkovic coube a 43.
Se hoje houvesse uma votação entre Gabigol e Arrascaeta, quem seria o mais votado para vestir a 10? Eu escolheria o uruguaio, até porque o Flamengo teve outros grandes artilheiros decisivos, como Nunes, e que honraram a camisa 9, legítima dos atacantes. Adriano vestiu a 10, mas a favor dele pesavam o fato de ter surgido na base rubro-negra, ter sido titular da seleção brasileira numa Copa do Mundo e também por ser, até hoje, um ídolo no exterior.
E o Gabigol? Sem dúvida alguma é um dos maiores ídolos do futebol do Flamengo. Isso é inegável. Está na história como um legítimo camisa 9. Isso não basta? Vamos lembrar que, no Brasil, Romário, Ronaldo e Bebeto entraram para a galeria de ídolos da seleção usando outras camisas. Gabigol também vestiu a 10 de Pelé no Santos, assim como Petkovic e Diego Ribas. Se isso vale como currículo, posso levar em consideração. Mas como sou da antiga e não me deixo levar apenas pelo comportamento midiático dos jogadores, digo que ele precisa se ajustar ao que se exige de um legítimo 10. E o comportamento fora de campo, e nos eventos do clube, faz parte desse portifólio.
- Continua após a publicidade -
* Sergio du Bocage é apresentador do programa No Mundo da Bola, da TV Brasil
Ag. Brasil
*Todos os artigos publicados são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não expressam a linha editorial do portal e de seus editores.